sábado, 12 de abril de 2008

De volta

Poderia dizer que estava viajando para a Patagônia nesses últimos dias. Poderia inventar ainda que estava com dengue, ou febre amarela (agora é tão comum que alguém podia até acreditar). O fato é que estive aqui, como sempre. Sã e salva, como há tempos não estive. Mas a diferença é que tenho sentido muita, muita , muita saudade nos últimos tempos. E foi ela que me fez divagar.

***

A amiga que tive (texto escrito para mulheres)

Sabe né. A gente tem amiga para tudo. Amiga para dar risada da sua bola-fora, amiga para comprar roupa junto, amiga para revisar o trabalho que você fez de madrugada, atropelando toda e qualquer regra de concordância. Amiga pra dizer que você é burra e tapada por correr atrás dele ainda. Amiga para beber junto, porque tem a mesma resistência ao álcool, a mesma grana pra torrar com cerveja e o mesmo saco para freqüentar bar em segunda-feira chuvosa que você. Amiga que tem um gosto tão diferente do seu que você até pensa, de uma forma meio egoísta, que ela nunca vai te roubar um pretendente, mas mesmo assim você se questiona como sendo tão diferentes, conseguem ser tão amigas.
Já falei da incrível cumplicidade que une duas mulheres. Você pode adorar aquele seu amigo, ser fã dele e tudo mais. Você pode até trocar de roupa na frente dele. Ele pode até ser gay, não importa. É diferente a amizade que você sente por ele e a que você sente por outra mulher.
Você tem um irmão que é a sua cara, que dá risada contigo e detesta ir à casa de parentes tanto quanto você. Mas é diferente o que você sente por ele e o que você sente por sua irmã. Querer ser igual a mais velha, ser o modelo da mais nova, ou achar que se o mundo inteiro se virar contra você, ainda assim você terá uma pessoa com quem vai contar, são coisas que só quem tem uma irmã sabe. A mesma coisa com pai e mãe. Você os ama da mesma forma e repete isso aos quatro ventos e com toda a força do seu coração. Mas você sabe, no fundo sabe, que são amores diferentes. O que liga duas mulheres é mais carnal, é de sangue, o mesmo que vocês vêem descer quase ao mesmo momento quando convivem muito tempo lado a lado. É o sentimento forte, sólido e consistente, mesmo quando se maltratam.
Duas amigas, duas irmãs, mãe e filha. Isso é tão forte, que não sei explicar. Uma das histórias que mais me lembro da infância era o relato em uma revista (Abre parênteses: cresci lendo Claudia e isso me fez querer ser jornalista desde muito cedo. A herança dessa leitura não foi apenas de saber o que era orgasmo e clitóris muito antes das minhas colegas de classe, mas também de ter vontade irrepreensível de querer contar histórias alheias. Fecha parênteses) A história em si era contada por uma leitora, em um espaço aberto para quem quisesse contar suas experiências de vida. A dela era singular. O ódio que existia entre ela e sua mãe as moviam e resultava sempre em farpas trocadas. As linhas me chegavam como um soco no estômago. “Saímos de casa eu e meu pai e ela tinha ficado em casa. Não sabia que eles tinham brigado. Quando eu e papai chegamos felizes e alegres, ela me pegou pelo braço, me empurrou para dentro do quarto e esbravejou: -Vai, você quer o que agora? Dormir com ele? Sei que você quer!” Para mim, ler que uma mãe dizia tal disparidade para a filha era inconcebível. Recatada, não havia entendido que aquela era uma revelação. Toda mulher será rival de outras mulheres durante toda sua vida e a primeira delas será sempre sua mãe, pela atenção que o pai dispensa à nova criaturinha de rosa. “Quero mesmo é ter um filho homem, para ele me amar por toda a vida”, diz uma amiga minha.
A lei diz que as meninas são dos seus pais e os meninos são das suas mães e ninguém mudará isso. Assim como nada muda que uma menina que é amiga de um menino no jardim de infância vai ouvir: “tá namorando”. Assim como o menino que só freqüenta a roda das meninas vai ouvir que é gay. Assim como você pode falar de tudo para uma pessoa, mas você sabe, no fundo sabe, que ela só vai entender de uma forma plena, total, transparente tudo o que você passou realmente, se ela for mulher. Da mesma forma que você lê uma cena escrita por um homem e se emociona, mas lê a cena descria por uma mulher e toda emoção transpassa o tempo e o espaço que te separam da autora e te faz reviver e sentir junto tudo o que foi por ela descrito. Da mesma forma que você briga com um homem, mas com uma mulher rompe laços. Da mesma forma que você se pergunta como pode inveja, cumplicidade, carinho, ciúmes e raiva existirem simultaneamente em uma mesma amizade, você sabe que isso é perfeitamente possível entre duas mulheres. E você sabe, no fundo sabe, que só ela te completará, como um espelho inverso. E a falta dela será como o espaço vazio e renitente ante a sua presença.

Bom, é isso que tenho a dizer das amigas que tive.

Beijos e desculpas.

Da ausente,
Beatriz

13 comentários:

Mulheres de Atenas disse...

Quando ela falou que tava com saudade de mim porque eu era uma das amigas de bebedeira, logo senti que renderia um ótimo texto.
Afinal, mulher sempre dá um bom caldo, sem nenhum feminismo gritante aqui, longe disso.. mas que dá, isso dá! hehe

Belo texto, Beatriz, demorou mas abalou hahaha

ps. e tb quero aproveitar e declarar meu amor pelas minhas amigas, Mulheres de Athenas.

beijão,

Carolina, a de Athenas.

Maristela Valério disse...

Hum.. legal!!!hehehe
agora sério: posso dizer que as amizades mais verdadeiras q tive foram c outras mulheres, acho q é uma coisa meio d sexto sentido feminino, que existe, apesar das críticas de quem não o possui. Amigas d verdade que mesmo longe a gente sempre sente de elas estão bem ou mal, sabe se tem algo d errado acontecendo e sabe q elas sentem q vc ñ está bem. Acho q é o nosso instinto materno ou maior (se é q existe algomaior do que isso) que nos une.
E eu , Beatriz? Sou sua amiga de que?

Srtª Amora disse...

é incrível ler esse texto após postar um falando de uma amiga no meu blog.

é exatemente isso, diversos sentimentos num só.

belo texto.

bjos!

Яoьεяτα disse...

Lindo blog.

Tb participo de um blog só com mulheres,e o tema é sobre futebol, rs

http://futeboldeminisaia.blogspot.com/

Bjs, gostei mesmo

Unknown disse...

gente que delícia... é de FATO essas coisas que nos parecem, que nos unem! eu tenho a luciana, minha alma gemea, somos tudo isso!
estamos longe uma da outra mas até saberia dizer sua resposta para cada situação... lindo texto! bjus da KK

Everaldo Ygor disse...

OLá...
Uma bela e intensa crônica...
Amizade, saudade, são elementos para construir grandes histórias peculiares, com elementos que só a autora pode conhecer/descrever, leva o leitor a refletir sobre os dias - mas transmite um recado para verdadeiras amizades, independentes do sexo...
Abraços
Everaldo Ygor
http://outrasandancas.blogspot.com/

Frank Cunha disse...

Bom,primeiramente muito bom sua escrita e seu modo de expressar a amizade.Que pra mim é muito bom,poucas pessoas descrevem dessa forma,citada por você.
Muito bom seu blog,moça.
Meus parabéns

Abraços.
http://polvoloko.blogspot.com/

Frank Cunha disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Frank Cunha disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Jepre disse...

Lindo...
Tenho orgulho de vc!
Obrigada pelo carinho,
se inspirei um pouquinho
q foi o texto!
Desculpe a demora pra responder
mas é que a piscina, a margarina,
as carolinas...
Não tem jeito o prefácio desse
livro é meu, estamos unidas não só pela irmandade, mas tb pelos assuntos em comum.
Não demore mais tanto.
bjos

Michele Matos disse...

Nossa!! Texto perfeito...
Nunca vi alguém descrever amizade entre mulheres dessa forma, concordo com cada colocação.

Anônimo disse...

Nossa, amizade entre mulheres, bem não tenho muitas pra poder dizer coisasa sobre, msu amigo masi antigos são meninos, só eles me entendem por completo.....
enfmi, não reclamarei da ausênca pq não sou um exemplo, mas só por isso^^
bjs

Mulheres de Atenas disse...

A amizade entre mulheres é inexplicável, mas Beatriz soube descrevê-la e tenho certeza que apenas outras mulheres compreenderão exatamente o que ela diz, pois somente as mulheres conseguem encontrar exemplos para as situações comentadas...
Acredito que as 'amigas da mídia' são também inspiradoras deste texto, então termino o comentário dizendo um TE AMO do fundo do coração para estas duas Mulheres de Atenas.
bjs